sábado, 23 de janeiro de 2010

Eu também nunca me vou habituar

Hoje, tenho razões para dizer que, tal como o Calvin e a Paracucanunca me vou habituar... a comunicar "a notícia" à família. Subscrevo inteiramente o que eles disseram...

Como se faz um psiquiatra

A pedido de várias famílias, aqui vai uma dissertação de alguns minutos sobre "como se faz um psiquiatra"

O que é um psiquiatra?

Um Psiquiatra é um médico. Só que, em vez de tratar outro tipo de coisas, como por exemplo hemorróidas, especializa-se no diagnóstico e tratamento de pessoas com doença mental. Mas o papel do psiquiatra, como o de qualquer médico, não se deve limitar só a isso... Deve incide sobre a prevenção da doença e sobre a promoção da saúde, bem como educação para a saúde.
Ocasionalmente, há psiquiatras que pensam que esta especialidade é um ramo da filosofia. Isto dá-lhes uma abrangência completamente diferente, reservando-se a si próprios o direito de opinar sobre tudo o que vier à discussão. São uma espécie de Marcelos Rebelos de Sousa da Psiquiatria, mas sem o brilhantismo...

Quais são as implicações do facto de o psiquiatra ser médico?

O facto de ser médico tem várias implicações associadas, como por exemplo:
  • Tem uma licenciatura em Medicina, que inclui um estágio final, e um período de formação chamado Ano Comum, em que passa por várias especialidades médicas "fundamentais".
  • Faz um Juramento no início da carreira, em que, entre outras coisas, jura que o doente é a sua primeira preocupação.
  • Recebe sempre no Natal figuras, estatuetas, azulejos e outras obras de arte a lembrar-lhe isso mesmo.
  • Faz uma especialidade de Psiquiatria (5 anos além do ano comum), com vários estágios dentro das diferentes sub-áreas da especialidade.
  • A preparação em Medicina confere conhecimentos não só para fazer diagnósticos, mas também para escolher a melhor opção terapêutica, de acordo com o seu conhecimento.
  • Os psiquiatras estão sujeitos à tutela deontológica da Ordem dos Médicos.
  • De vez em quando (regra geral, uma vez ou mais por semana) os psiquiatras têm de fazer uma coisa chamada serviço de urgência. No serviço de urgência, o médico exercita várias competências: técnicas de persuasão, luta na lama, introdução à burocracia, introdução ao cargo de polícia sinaleiro... de psiquiatria propriamente dita, o serviço de urgência tem, de vez em quando, algumas coisas...

Que terapêuticas é que o psiquiatra pode realizar/administrar?


O psiquiatra pode prescrever fármacos ou prescrever/realizar outro tipo de terapêuticas (por exemplo, electroconvulsivoterapia, estimulação magnética transcraniana....). Pode, igualmente, articular com outros técnicos de saúde mental, para realizar outro tipo de intervenções  (como por exemplo, a dança da chuva, que foi fruto de várias meta-análises no The Onion e no Q Fever...), podendo realiza-las se tiver qualificação para tal.
Como médico, o psiquiatra está deverá prescrever/realizar intervenções devidamente baseadas na evidência científica. Isso não significa que não haja psiquiatras que não entendam que, pelo facto de uma determinada escola de pensamento, em que se inserem, ter um dado tipo de postura, não a defendam como um verdadeiro talibã, mesmo que a evidência científica a sustentá-la não seja assim tão forte...
Nesse caso específico das religiões, devo dizer que sou mais pela Bimby...
Normalmente, o psiquiatra não trabalha isolado. Trabalha em equipa com vários profissionais: o psicólogo, o psicopedagogo, o médico de família, o assistente social... mas também, segundo algumas escolas, com o padre, o xamã e a stripper...

Qual é a diferença entre um psiquiatra e um psicólogo?

  • A primeira diferença é o tipo de canudo... O psicólogo tem uma licenciatura em psicologia. O psicólogo é exímio a fazer avaliações ("o que vê neste desenho?"), em caso de dúvidas de diagnóstico e, normalmente, tem formação em psicoterapia, pelo que pode realiza-las a pedido do psiquiatra ou do médico de família.
  • Teoricamente, quem faz os diagnósticos é o psiquiatra, apoiado na história clínica, no exame do estado mental e nos exames complementares de diagnóstico, que podem incluir exames imagiológicos ou análises clínicas, e a avaliação feita pelo psicólogo.
  • O psicólogo não tem vinhetas - não pode passar receitas nem atestados... (too bad.... :P)

Para se ir para psiquiatria é preciso ter uma determinada estrutura?


Não. Se bem que ter 1,90m e 110 kg de peso ajude, quando se trata de doentes mais agitados...
A nível psicológico, tal como os cirurgiões se têm que esterilizar antes de uma operação, o psiquiatra também deve, durante a formação, adquirir ferramentas para lidar com o sofrimento próprio e o dos outros...
Por experiência própria, devo dizer que o que mais custa não é lidar com as pessoas com doença mental, mas sim com a sociedade em que estão inseridos...



Como se forma um psiquiatra?


Depois de passar pela licenciatura em medicina, onde tem contacto com psicopatologia em várias vertentes, o aspirante a psiquiatra tem de fazer um exame baseado num livro de Medicina Interna. Na prática, isto significa empinar capítulos desse livro e fazer perguntas de escolha múltipla sobre isso...
Depois, faz 12 meses de ano comum, já remunerado, em que passa por várias especialidades, a saber: Medicina, Cirurgia, Pediatria, Ginecologia/Obstetricia e Medicina Geral e Familiar.
Só aí, se sobreviver a este processo todo, ingressa na formação específica do internato médico. Durante este período, passa por vários estágios, a saber:
  • 24 meses de internamento - em enfermarias de serviços de psiquiatria
  • 3 meses de neurologia
  • 3 meses de psiquiatria de ligação (a disciplina da psiquiatria que lida com a interrelação com as outras especialidades médicas)
  • 6 meses de pedopsiquiatria
  • 6 meses numa estrutura de internamento parcial (hospital de dia)
  • 3 meses em serviços de reabilitação de abuso de substâncias
  • 3 meses em serviço de psiquiatria comunitária
  • 12 meses em estágios opcionais.
É obrigatória, neste período, a realização de serviço de urgência e a realização de consulta, ainda que com supervisão, pelo menos em teoria...
E é assim que se forma um psiquiatra... Em posts próximos, focaremos "Como se faz um electricista", Como se faz um serralheiro mecânico" e "Como se faz um boneco de loiça das Caldas"...

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Bujoterapia

Dos cânones da Psicologia e da Psiquiatria constam várias abordagens terapêuticas, desde a electroconvulsivoterapia até às psicoterapias transpessoais.
Não vou aqui hoje discutir a eficácia/efectividade de nenhuma das mais clássicas, apesar de subscrever plenamente o que um professor irlandês de Psiconeuroimunologia dizia: "If I ever go nuts, connect me to the mains..." (Tradução livre: "Se eu ficar doente, ponham-me o dedo na ficha eléctrica e dêem-me músicas do Nel Monteiro") (Tradução do Google: "Se eu enlouquecer, me ligar à corrente")



Contudo, gostaria de deixar aqui uma nota sobre a bujoterapia.


A bujoterapia já é conhecida desde o Egipto. De acordo com a evidência científica, tem um indubitável valor profiláctico no que toca à saúde mental. Pensa-se que tenha ainda um valor curativo no que toca à oligúria.


A formação em bujoterapia não dura muito tempo. Talvez uns 30 minutos... É feita, de forma continuada, nas tascas à volta das escolas e faculdades deste país... As pessoas do sexo masculino são, à partida, peritas na coisa.
A bujoterapia não requer um grande investimento. Apenas a necessária e suficiente quota-parte na cadeia de lojas de distribuição alimentar mais próxima... Consta que a bujoterapia tem uma relação custo/benefício bastante boa na Alemanha, motivo que vai originar, segundo se espera, um grande fluxo migratório para esse país, nos próximos tempos.


Para os que ainda se questionam sobre o que é a bujoterapia, penso que as instruções para a sua realização serão elucidativas. As instruções que se seguem são válidas para o sexo masculino (oh não, mais um post machista...) mas poderão ser adaptáveis facilmente ao sexo oposto...


1) Vá à loja da cadeia de distribuição alimentar mais próxima e compre 5 litros de cerveja, ou arranje uma geringonça destas ou similar e siga as instruções
2) Assegure-se que a "patroa" foi sair com as amigas
3) Convide os amigos lá para casa
4) Saboreie em conjunto com os seus amigos o líquido amare... dourado...
5) Permita que cada um fale de si, de mulheres, do trabalho, de futebol, do que quer que seja... (tópicos para as mulheres: compras, roupa, pensos higiénicos - grande parte dos anúncios de pensos higiénicos revelam-nos que cada vez que um grupo de mulheres se junta é para falar sobre pensos higiénicos ou tampões, o que quer que seja...)
6) Repita o tratamento semanal ou quinzenalmente.


Vantagens da bujoterapia:
  • Promove a autoestima
  • Melhora o suporte social
  • Melhora a assertividade e a expressão das emoções.
  • Quando em contexto de obra, melhora a qualidade dos piropos
Advertências:

  • A bujoterapia, como qualquer tratamento, não deve ser usado em excesso, pois transforma fígados saudáveis em iscas com elas.
  • O consumo agudo de bujas pode fazê-lo fazer table-dancing e imitar a Amy Winehouse... 
  • A bujoterapia dá dependência se for feita todos os dias... 
  • Pode, igualmente, contribuir para sugar uma parte significativa dos seus rendimento. Mas isso, também os papa-reformas e o Ministério das Finanças... já para não falar daquelas senhoras que gostam de dançar em varões...

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Eu sobrevivi...

... à vacina da gripe A!

E confesso que, aparte umas amigdalas hiperemiadas [vermelhas] e alguma odinofagia [dor de garganta], e as mazelas decorrentes de uma técnica de injecção com ligeiras semelhanças com as formas de tortura nos campos de concentração do regime de Pol Pot, nem sequer uma interrupção de gravidez tive...

Mas também só passaram 24 horas... Ainda vou a tempo de ter uma intoxicação por mercúrio, dada a quantidade cataclísmica de timerosal existente na vacina, de acordo com algumas fontes (as mesmas que dizem que a microsoft doa 5 cêntimos por cada e-mail que reencaminhemos...)

Se eu por acaso começar com um mutismo grande, daqueles que parecem mesmo um coma, eu coloco aqui só para terem um update da situação...

(Ah, isto não é o twitter? Então esqueçam...)

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Ecce homo...

"A homossexualidade não é uma doença" - a frase, repetida até à exaustão pelo assistente que me calhou na rifa em tudo quanto era aula prática de Psiquiatria, na faculdade, ganhou um novo ênfase nos últimos meses.

Saiba-se lá porquê, os media deste canto da península Ibérica (há quem diga que pertencemos ao continente europeu...), desataram, há uns meses, a apregoar aos quatro ventos, a existência de uma suposta "cura" para a homossexualidade.

Quer dizer, lá porque a malta tem um curso de Medicina, e, de vez em quando, ser equiparada à categoria de  Divindade (com direito a queixas nas mais altas instâncias judiciais deste país, nomeadamente, os tablóides) nós podemos escolher quem é que gosta de meninas e quem é que gosta de meninos, ou que cavidades corporais é que as pessoas usam, e para que funções...

Decerto honrado por ter sido promovido a moralizador das cavidades corporais do pessoal, o sempre douto colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos levou como trabalho para casa a elaboração de um parecer sobre esta matéria. Lá se pronunciou, da forma diplomática que lhe é característica, reiterando a frase predilecta do meu assistente, mas dizendo que havia, ainda, na classificação da Organização Mundial de Saúde, uma coisa reminiscente, chamada Homossexualidade Egodistónica.

E aqui é que a porca torce o rabo... Salvo seja, porque ninguém quer discriminar a porca!
Egodistónico é um palavrão que se usa quando aspectos do comportamento, dos impulsos, dos pensamentos ou da personalidade são desconfortáveis para um indivíduo, ocorrendo não por sua escolha mas contra a sua vontade.

Para perceber este laivo de "psiquiatrês" que é o conceito de egodistonia, deixemos por agora a questão da homossexualidade: imaginemos uma pessoa a quem acorrem à cabeça, de forma sistemática e contra a sua vontade, ideias de bater na sogra. Não é assim tão comum, mas suponhamos que essa pessoa até gosta da sogra. De repente vêm estas ideias à cabeça, não havendo outro remédio senão lutar contra elas...
A questão é que lutar contra estas ideias dá uma trabalheira enorme. Pode, por exemplo, fazer com que a pessoa deixe de fazer a sua actividade normal... Pode, inclusive, conduzir a ansiedade e depressão, com agravamento dos sintomas. É este o significado de egodistonia.

A intervenção de qualquer técnico de saúde mental vai no sentido de baixar, à pessoa em questão, os níveis de ansiedade, os quais aumentam, em espiral, a egodistonia, bem como impedir que a pessoa fique presa à volta do mesmo pensamento. (não é o pensamento em si mas o "ficar presa" que nos preocupa...) Isto faz-se com psicofármacos, com psicoterapia e com psicopedagogia...

Portanto, em relação a esta questão, aquilo que se vai tratar é essa tal de egodistonia.

Com a homossexualidade egodistónica, deverá passar-se o mesmo. O cerne da questão não é o ser-se homossexual, mas sim a egodistonia, nestes indivíduos.  É ela, bem como as suas consequências, que deve ser alvo de tratamento... e sempre, como em tudo na medicina, com o consentimento livre e esclarecido do indivíduo em questão...

Agora, dizer que a homossexualidade é uma doença e tem tratamento, é tão verdade como dizer que, numa mulher, ter peitos pequenos é uma doença e que se deveria pôr os Wonderbra à venda nas farmácias sob prescrição médica, e comparticipar os implantes de silicone... (Com a devida vénia às senhoras que lêem isto e deixando que façam a analogia com o equivalente no sexo oposto...)